MP 1.304 traz riscos para o Marco Legal da Geração Distribuída
Imposição de modalidades tarifárias aos consumidores de energia solar pode resultar em desrespeito às regras de transição estabelecidas pela Lei 14.300


A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) defendeu o cumprimento de prazos de transição estabelecidos pela Lei 14.300 e o direito de consumidores que investiram em sistemas de micro e minigeração distribuída. O posicionamento foi feito durante audiência pública sobre a Medida Provisória (MP) 1.304/2025. A reunião, promovida pela comissão mista que analisa o tema, foi realizada no Senado, em Brasília (DF), na quarta-feira (15/10).
O encontro contou com a presença de representantes de associações e órgãos do setor elétrico, que debateram propostas para a MP, em especial sobre os cortes de geração (curtailment) que afetam usinas renováveis do país. A matéria herdou diversos pontos de discussão anteriormente incluídos na MP 1.300, aprovada pelo Congresso em setembro.
Uma das questões mais polêmicas é a imposição de cortes e limitações da micro e minigeração como forma de atenuar o excesso de energia na rede em momento de baixa demanda. Uma das possibilidades sugeridas foi a inclusão da modalidade, que permite que consumidores produzam a própria energia por meio de paneis solares, no mecanismo de rateios para ressarcir os grandes geradores.
Durante a audiência pública, a vice-presidente da Absolar, Bárbara Rubim, alertou para a importância de que sejam observada as regras de transição estabelecidas pela Lei 14.300, que criou o Marco Legal da Geração Distribuída. “Entendemos que o benefício do consumidor que gera a própria a energia tem que ser respeitado.”
“É muito importante que qualquer alteração que ocorra no setor elétrico, envolva ela o curtailment, envolva ela novas estruturas tarifárias, respeite os períodos de transição trazidos pela lei 14.300”, destacou Rubim.
Ela apontou para a existência de três cenários de transição: direito adquirido até 2045, para quem fez os projetos até janeiro de 2023; transição até dezembro de 2030 para quem fez a conexão até julho de 2023; e transição até dezembro de 2028 para os demais projetos.
“Ao final dessa transição, o consumidor passa a pagar integralmente pelo uso da rede. Ele também passa a pagar por outras coisas que nós ainda não sabemos quais são, infelizmente”, disse Rubim, destacando que a lei determina que um cálculo de custos e benefícios da micro e mineração distribuída deveria ter sido concluído pela Aneel em até 18 meses após sua publicação.
“Esse cálculo está mais de dois anos atrasado, então não sabemos, do ponto de vista prático, quais são os custos e os benefícios da micro e minigeração distribuída para o Sistema Interligado Nacional”, ressaltou.
Mais de 1,5 milhão de empregos
A vice-presidente da Absolar apontou que uma mudança nas regras tarifárias que desrespeite os períodos de transição do Marco Legal, além de custar a credibilidade do país, coloca em risco os mais de 1,5 milhão de empregos que foram criados pela micro e minigeração distribuída.
“Pode parecer excessivo dizer isso, mas basta olhar para outros países que forçaram mudanças similares, da noite para o dia, como foi o caso da Alemanha, Espanha e da Califórnia. Cerca de 70% dos empregos se perderam. Não queremos que isso aconteça no Brasil.”
Rubim lembrou que que mais de 75% de toda a micro e minigeração distribuída está em telhados. “São telhados de casas de comércios, de propriedades rurais. Querer comparar esse consumidor com um grande investidor institucional para fins de aplicação, por exemplo, de cortes de curtailment, está muito longe de ser uma política de equidade e de justiça tarifária.”
“Esses consumidores que investiram na própria energia acreditaram em uma política pública e não podem ser penalizados por isso. A micro e minigeração representa mais de 30 mil microempresas espalhadas pelo Brasil, mais de 1,5 milhão de empregos e mais de 22 milhões de pessoas diretamente beneficiadas. Não estamos pedindo privilégio, nós queremos manter o direito do consumidor.”
A MP 1.304 precisa ser votado até o dia 7 de novembro, quando perde a validade. A expectativa é que o relatório seja apresentado pelo relator da proposta, senador Eduardo Braga (MDB-AM), nas próximas semanas.

Ricardo Casarin
Repórter de economia e negócios, com passagens pela grande imprensa. Formado na Universidade de Metodista de São Paulo, possui experiência em mídia impressa e digital e na cobertura de diversos setores como petróleo e gás, energia, mineração, papel e celulose, automotivo, entre outros.
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