Performance ratio em usinas fotovoltaicas: da definição à inovação
Funcionamento de plantas solares envolve uma grande quantidade de dados que devem ser analisados pelos operadores do empreendimento

Após um longo período de negociação, instalação dos equipamentos e homologação pela concessionária de energia, chega o esperado momento da entrada em operação da usina fotovoltaica. Inicia-se então um processo contínuo de acompanhamento dos muitos parâmetros de funcionamento e variáveis que determinam a geração de energia. São várias as grandezas envolvidas: potências aparente, ativa e reativa; irradiância; temperatura ambiente e dos módulos fotovoltaicos; tensões e correntes CC nas strings e CA nas fases; taxa de distorção harmônica, etc.
Esses dados geralmente são obtidos através dos portais de monitoramento disponibilizados pelos fabricantes dos inversores e/ou pelo SCADA (Supervisory Control And Data Acquisition - Sistema de controle e aquisição de dados) instalado na usina. Essas plataformas têm como função apresentar as informações relevantes à geração de forma compilada e objetiva, reduzindo a carga de trabalho dos operadores do empreendimento.
Quando se trata de usinas fotovoltaicas, um dos KPIs mais difundidos é o Rendimento Específico (RE). Esse indicador expressa a quantidade de energia (em kWh) que foi gerada por unidade de potência em módulos instalados (kWp). Via de regra, é considerada a energia medida após os inversores on-grid da usina.
Este indicador é de bastante utilidade, pois além de simples entendimento, permite a comparação entre o desempenho de diferentes usinas (em localização, tecnologia utilizada, etc). No entanto, possui limitações relevantes por não considerar vários fatores que influenciam diretamente a produção fotovoltaica.
Para contabilizar as perdas inerentes ao funcionamento da usina e ter um entendimento mais fiel sobre seu comportamento, faz-se uso da Performance Ratio (PR). De forma simplificada, a PR pode ser definida como a relação entre o desempenho real do sistema fotovoltaico em relação ao máximo desempenho teórico.
A resistência nos conectores e cabeamentos, sombreamento e sujidade sobre os módulos, eficiência do inversor, degradação e mismathc dos módulos, falhas na rede elétrica, são alguns dos fatores que acabam por minimizar o potencial de geração de um empreendimento solar.
Na literatura, a PR aparece escrita das várias formas. No entanto, a fim de se ter uma abordagem mais didática, iremos aqui expressa-la em função das potências CC e CA. A primeira maneira de escrever a PR é em sua forma simplificada. Sendo dada pela relação:
Porém, essa forma pouco agrega ao amplo entendimento do comportamento da usina. Portanto, devemos quantizar as perdas existentes em campo. A primeira delas é a irradiância.
Nas condições reais de operação, muitas vezes não se obtém sobre os módulos a irradiância de 1000 W/m2 que é considerada pelas STC (Standart Test Conditions). Sendo assim, é preciso corrigir a PR em função do recurso solar que efetivamente está incidindo sobre a planta fotovoltaica. A PR corrigida pela irradiância (PR IR) é dada por:
As STC também estipulam uma temperatura de 25°C para o módulo FV, novamente algo distante das circunstâncias de operação de usinas fotovoltaicas. É sabido que temperaturas elevadas provocam perda de tensão das células FV, levando também a uma menor potência de saída do arranjo solar.
Durante a fase de projeto, faz-se simulações em softwares específicos (como PVsyst, PV*SOL, HelioScope) já considerando as perdas durante a operação para estimar a produção efetiva de energia. Porém, no local muitas vezes a temperatura difere da considerada pelos projetistas em suas simulações. Sendo assim, é necessário fazer a correção da PR também devido a diferença global de temperatura. Logo é adicionado um termo que quantifica essa perda em função dessa variação.
Onde:
TempModProj: temperatura considerada de projeto (geralmente baseada em registros históricos de temperatura do local da instalação);
Tmod: temperatura aferida pelo sensor de temperatura do módulo e β o coeficiente de temperatura (determinado pelo fabricante).
Obs.: Caso não tenha sido considerado inicialmente perdas por temperatura na fase de projeto, pode-se fazer (Tmod - 25°C) como alternativa ao segundo termo entre parênteses da equação acima.
Como pode-se perceber, a PR é um indicador de qualidade adimensional; sendo geralmente representado na forma de fração ou de porcentagem. Seu valor representa um forte indicativo do quão bem projetada e executada foi uma usina fotovoltaica.
Não existe uma norma internacional que estipule valores adequados de PR. No entanto, é usual no mercado aceitar valores de PR anuais entre 0.75 e 0.85. Resultados abaixo dessa faixa são motivo de atenção por partes dos operadores e proprietário da usina. Valores acima de 0.85 são ilusórios e não devem ser esperados.
Uma vez que a PR esteja adequadamente calculada, podemos lançar mão de um outro KPI bastante útil para gestão de desempenho de plantas fotovoltaicas. O Energia Esperada (EE) é quantidade de energia que deveria ter sido produzida num intervalo de tempo passado. Ele é definido pelo produto entre PR calculada e as Horas de sol pico (HSP) do local de operação.
Logo, é fácil ver que a energia esperada de uma determinada planta fotovoltaica é dada pela sua capacidade produtiva inerente (com as suas respectivas perdas) e as condições intrínsecas do local onde ela foi instalada.
Um KPI menos conhecido, mas não menos útil, é definido entre a razão entre o Rendimento Específico e a Energia Esperada. Esse indicador recebe o nome de EPI do inglês Energy Performance Index.
Ele nos mostra o quanto a planta FV gerou, num determinado período de tempo, em relação ao que ela deveria ter gerado dado a seu desempenho e o potencial de geração do local em que ela se encontra. É indicado para avaliação de possíveis falhas na produção de energia e comparação de plantas diversas.
Pelo exposto até aqui, fica notório que para correta contabilização das perdas em plantas fotovoltaicas é necessário o uso de equipamentos para medições de irradiância ao nível dos módulos e da temperatura de operação destes. Tais equipamentos, juntamente com mais alguns acessórios, formam as chamadas estações solarimétricas. Tais equipamentos costumam ter valores relativamente altos para aquisição e demanda pessoal especializado para sua instalação e manuseio.
Logo, mensurar adequadamente o desempenho de usinas em campo demanda um custo considerável para os stakeholders do empreendimento. Contudo, há uma outra possibilidade surgindo no horizonte. Ou melhor, vindo de cima.
É consenso que os satélites revolucionaram a sociedade moderna, trouxeram enormes benefícios à comunicação e abriram um enorme leque de possibilidades em vários setores da economia recente. Para o setor fotovoltaico, não é diferente.
Hoje é possível ter medições de irradiância por satélite com incertezas entre 4% e 6%, enquanto pirômetros possuem incertezas de aproximadamente 5%. Em casos reais, comparando-se irradiação diária medida in loco e via satélite, a diferença pode ser menor que 0,5%.
Aliado a essa nova possibilidade de aquisição de dados – que podem ser complementadas com as medições em campo, quando existirem – temos uma análise mais profunda utilizando conceitos de inteligência artificial possibilitando insights sobre o desempenho da usina. Com essa motivação, a equipe do laboratório Fotovoltaica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desenvolveu uma plataforma de tratamento de dados e cálculo avançado de desempenho das UFV.
Através da ferramenta, é possível identificar falhas e gerar diagnóstico remoto, que auxiliam na correção mais ágil, além de monitorar métricas personalizadas como indisponibilidade dos equipamentos, dando uma nova visão para os gestores da usina e facilitando as tomadas de decisão.
Perdas por sobrecarga do inversor, por sujeira nos módulos ou falhas no posicionamento dos rastreadores que podem ser significativas e muitas vezes passarem despercebidas pelas equipes de campo, são prontamente apontadas pela solução do grupo de pesquisa.
A possibilidade da identificação rápida de tais perdas acaba por facilitar enormemente a organização das equipes de manutenção e reduzir a carga de trabalho dos operadores da usina.
Essa nova ferramenta, que traz aos empreendimentos fotovoltaicos um meio inovador de avaliar problemas e seu desempenho, está sendo aplicada no mercado através da parceria entre a Fotovoltaica/UFSC e a PV Operation.
Na operação de usinas solares agora de fato o céu é o limite.
Fontes e sugestões de consulta:
[1]: IEC TS 61724
[2]: EPE-DEE-RE-065/2013-r2
[3]: SolarPower Europe (2019), Asset Management Best Practice Guidelines, Versão 1.0. SolarPower Europe. (Disponível em www.solarpowereurope.org)
*Paulo Soares atua desde 2015 no mercado de energia solar fotovoltaica, com passagem por algumas das principais empresas do segmento de geração distribuída do país. É Bacharel em Física e Mestre em Engenharia Mecânica com ênfase em Sistemas de Energias Renováveis pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente é Executivo de Contas da PV Operation.
*Níkola Zaia de Figueiredo atua desde 2018 no mercado de energia solar fotovoltaica, com experiência em minigeração e desenvolvimento de hardware e software. É Graduado em Engenharia Elétrica pelo Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC). Atualmente é Diretor de Tecnologia da PV Operation.
Paulo Soares
Paulo Soares atua desde 2015 no mercado de energia solar fotovoltaica, com passagem por algumas das principais empresas do segmento de geração distribuída do país. É Bacharel em Física e Mestre em Engenharia Mecânica com ênfase em Sistemas de Energias Renováveis pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
Níkola Zaia
Níkola Zaia de Figueiredo atua desde 2018 no mercado de energia solar fotovoltaica, com experiência em minigeração e desenvolvimento de hardware e software. É graduado em Engenharia Elétrica pelo Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC).
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