A transição energética: o que vem a seguir para o Brasil?
Perspectivas para o setor de energia renovável do País em 2022


A governança ambiental e social estão agora na agenda da diretoria. As empresas brasileiras estão cada vez mais preocupadas tanto com o meio ambiente quanto com questões mais amplas de reputação, na medida em que as questões ambientais, sociais e de governança (ESG) se tornaram um elemento constante nas agendas das diretorias dessas organizações.
Naturalmente, a ESG agora está intrinsecamente ligada às finanças e o Brasil não é diferente de qualquer outro país nesse aspecto. E a evidência está aí para provar. Do dinheiro investido na BlackRock Brasil durante o primeiro trimestre de 2021, mais de um terço foi destinado para fundos ESG negociados em bolsa.
Além disso, as empresas agora estão levando sua mensagem de ESG ao governo. Em Abril de 2021, em uma cúpula do clima patrocinada pelos Estados Unidos, o Brasil se comprometeu a atingir zero emissões de carbono até 2050, uma previsão 10 anos mais cedo do que o planejado anteriormente.
Embora haja muito ceticismo bem fundamentado em relação às promessas ambientais e climáticas do presidente Jair Bolsonaro, vale ressaltar que os líderes de 30 das principais empresas do país sugeriram essa promessa em uma carta aberta ao presidente do Brasil.
A pressão contínua dos indígenas e de empresas internacionais está, lenta mas seguramente, forçando o governo do Brasil a agir sobre o clima. Essa mudança de abordagem ajudará a remover uma barreira importante para o investimento internacional em infraestrutura verde no Brasil.
Surgimento de energia eólica offshore soma ao mix de energias renováveis
Historicamente, a abundância de energia hidrelétrica no Brasil garantiu que sua matriz energética fosse inerentemente de baixo carbono. No entanto, existem problemas crescentes com o envelhecimento da infraestrutura hidrelétrica e, nos últimos anos, a geração tem sido irregular devido ao efeito da seca sobre os níveis dos rios.
O desaparecimento da energia hidrelétrica está alimentando o crescimento da energia solar e de outras formas mais sustentáveis de energia renovável. Na verdade, na última década, a produção de energia eólica do Brasil cresceu 20 vezes, e agora fornece quase 10% da eletricidade do país, com 19 GW de capacidade instalada.
Além de atingir altos níveis de insolação que beneficiam a geração solar, no Brasil também venta muito. Durante 2020, o fator de capacidade eólica foi superior a 40% em comparação com a média global de 35%. E com 7.400 km de costa atlântica, há uma oportunidade significativa para o setor eólico offshore no Brasil.
Junto com a solar, a energia eólica tem um futuro promissor no Brasil e esperamos ver um crescimento forte e contínuo ao longo de 2022 com o surgimento de novas oportunidades para a tecnologia eólica offshore flutuante.
O futuro ainda é brilhante para a energia solar
O ano de 2021 foi marcado pela expansão da energia solar, já que um número recorde de novos projetos foi registrado na ANEEL, o órgão regulador do setor elétrico brasileiro. Agora, uma nova legislação de geração distribuída está em andamento e, quando ratificada, introduzirá a cobrança gradativa pelo uso das redes de transmissão por meio das tarifas de uso do sistema de distribuição (TUSD).
A legislação propõe uma transição de 10 anos do modelo atual, com projetos já conectados à rede autorizados a operar de acordo com as regras existentes até 2045.
Este quadro legal revisado continuará a impulsionar uma “corrida do ouro” de novos projetos, à medida que os desenvolvedores se esforçam para vencer as tarifas mais altas, de forma que possam oferecer contratos de compra de energia (PPAs) mais baratos para compradores externos pelo maior tempo possível.
Antes das mudanças serem delineadas em setembro de 2020, o pipeline de projetos registrados era de 8,7 GW - somando-se a uma capacidade instalada de geração de energia solar que já havia atingido 10 GW no verão. O número mais que dobrou, chegando a 18 GW depois que a lei foi proposta, com a energia solar respondendo pela maior parte da nova capacidade.
Quando os subsídios renováveis são reduzidos ou retirados, não é incomum que as solicitações de novos projetos também diminuam. Esse tem sido o caso no Reino Unido, por exemplo, com reduções sucessivas - e a eventual retirada - do Feed in Tariff (FIT).
No entanto, embora esperemos ver a indústria brasileira parar para respirar, o mercado solar continuará sua trajetória de forte crescimento por causa dos fatores fundamentais que impulsionam a adoção da energia solar, combinados com a redução do custo dos painéis fotovoltaicos.
Além de mais investimentos em parques solares, esperamos ver uma maior aceitação no mercado residencial, à medida que os consumidores procuram administrar seus crescentes custos de energia doméstica.
A longo prazo, a nova lei também deve melhorar o ambiente financeiro, o que estimulará o investimento estrangeiro em projetos de energias renováveis, abrindo acesso a um leque mais amplo de opções de financiamento.
Agritech e energias renováveis: uma combinação poderosa
Há uma revolução acontecendo no mundo da agricultura - um dos setores mais importantes do Brasil - e envolve o uso de tecnologia, ou 'agritech', para melhorar o rendimento das safras, reduzir o uso de produtos químicos nocivos e proteger o solo.
A tecnologia está sendo aplicada de várias maneiras. Por exemplo, o uso de câmeras e drones que podem identificar e remover ervas daninhas sem a necessidade de pulverização em massa de produtos químicos, ou mesmo o plantio de vagens de sementes do ar.
A análise de dados de satélite pode ajudar a informar exatamente onde - dentro de alguns metros - as safras se beneficiariam com a aplicação de fertilizantes e em que quantidade. A previsão do tempo mais precisa usando estações climáticas locais permite que os produtores planejem o plantio, proteção e colheita para maximizar a produção.
De acordo com uma pesquisa de 2020 da McKinsey, o alcance da agricultura digital no Brasil é maior do que nos Estados Unidos - e está aumentando. Os agricultores brasileiros estão adotando a tecnologia para ajudá-los a cultivar e processar alimentos de forma mais lucrativa e sustentável.
Painéis solares fotovoltaicos são aliados naturais da tecnologia na revolução agrícola sustentável. Os parques solares podem fornecer a tão necessária energia para áreas remotas e fora da rede, permitindo que a planta de processamento, irrigação e equipamentos agrícolas se beneficiem de energia limpa a preços previsíveis. Esperamos que a agricultura seja um dos principais impulsionadores da energia solar fora da rede em 2022.
Alguns produtores estão percebendo os benefícios de combinar energia solar e cultura alimentar na mesma terra. Esta abordagem maximiza o uso da terra e permite o uso de energia solar fotovoltaica para melhorar as condições de cultivo.
Por exemplo, em regiões quentes, a placa solar pode ser usada para fornecer sombra às plantações durante a parte mais quente do dia, ajudando a prevenir a evaporação da água e reduzindo a necessidade de irrigação. Os painéis montados no solo também são compatíveis com animais menores de criação livre, como galinhas e ovelhas.
Armazenamento de energia por meio de hidrogênio
Com uma abundância de energia renovável, o Brasil está bem posicionado para lucrar com a economia do hidrogênio. Durante 2021, o Ceará anunciou planos para construir uma usina de hidrogênio verde de 600 mil toneladas por ano, o que a tornaria a maior do mundo. Além de ajudar a descarbonizar a economia industrial brasileira, o estado pretende exportar o hidrogênio que produz.
O hidrogênio também pode desempenhar seu papel na transição energética, fornecendo armazenamento de energia para microrredes, ou seja, sistemas de energia híbrida que compreendem geração e armazenamento renováveis, que fornecem acesso à eletricidade 24 horas por dia, 7 dias por semana.
Microrredes são redes de energia locais autossuficientes que podem servir a comunidade de um bairro, campus ou empresa. Eles podem operar paralelamente à rede de energia existente ou de forma totalmente independente.
Atualmente, as baterias fornecem a maneira mais direta de armazenar energia, mas o hidrogênio também está se tornando mais viável para armazenamento de energia à medida que o preço do equipamento especializado cai.
Esperamos ver projetos brasileiros de infraestrutura de hidrogênio mais significativos anunciados em 2022, fornecendo uma ampla variedade de aplicações.
A recuperação de empresas movidas a energia ecológica
Apesar do lamentável histórico ambiental do governo, o Brasil está se tornando cada vez mais bem posicionado para se beneficiar dos investimentos em sua economia verde ao longo de 2022.
As propostas legislativas mais recentes trarão segurança jurídica tanto aos contratos quanto aos consumidores, que terão os seus direitos garantidos e respeitados. O governo também aboliu os impostos de importação de equipamentos solares fabricados no exterior - uma medida destinada a encorajar o investimento interno.
O desenvolvimento de uma infraestrutura de energia confiável é essencial para que o país sustente uma economia forte. Novas políticas que apoiam o investimento verde criarão empregos em energia limpa e vão impulsionar a economia em geral, fornecendo às empresas brasileiras energia confiável de baixo carbono.
Em 2022, os investidores estrangeiros continuarão a apoiar o ressurgimento verde do Brasil. Tomar medidas urgentes e confiáveis para deter o desmatamento e a destruição ambiental pode abrir portas a investimentos internos.
Jamie MacDonald-Murray é presidente da Lisarb Energy, uma das desenvolvedoras de energia solar e renovável de crescimento mais rápido do Brasil.

Jamie MacDonald-Murray
Jamie Macdonald-Murray é presidente da Lisarb Energy. Passou 10 anos trabalhando no Brasil, onde desenvolveu um profundo conhecimento da cultura de negócios e todos os aspectos do ambiente operacional. Agora no Reino Unido, seus interesses em sustentabilidade e energias renováveis são a base para suas iniciativas de negócios, que incluem a Lisarb Energy e a Talo Homes – uma empresa que desenvolve moradias ecológicas construídas em fábricas no sudoeste da Inglaterra. O executivo mantém fortes conexões com comunidades de Finanças Verdes por meio das operações da Lisarb em Londres, e visita o Brasil regularmente.
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