A energia solar na geração distribuída
Neste artigo, apresentamos as regras da GD e seus aspectos contratuais em diferentes modelos de negócio


A energia elétrica é um insumo essencial e indispensável para a evolução e sobrevivência da sociedade e crescimento do país, uma vez que exerce papel relevante nos avanços tecnológicos e necessidades básicas da população.
Ou seja, o crescimento do país está diretamente relacionado a sua capacidade de produção e de consumo de energia elétrica. Posto isso, nota-se que um país em constante desenvolvimento não pode depender apenas de uma fonte de produção de energia elétrica.
Nesse sentido, é essencial a diversificação da matriz energética brasileira, para propiciar o crescimento econômico do país e mitigar a dependência de somente uma fonte energética.
Indiscutivelmente, o Brasil vem buscando cada vez mais a diversificação de sua matriz energética, em especial com as fontes renováveis.
Portanto, a necessidade de diversificar a matriz energética do país, além de mitigar os impactos ambientais noviços causados pela energia elétrica fruto de fontes não renováveis e a necessidade de observar os acordos internacionais de redução de emissões de gases poluentes, impulsiona o crescimento do país e aumenta a segurança no abastecimento.
Assim, a energia solar vem ao encontro dessa necessidade nacional, pois é uma energia produzida a partir de fonte renovável (limpa e sustentável para o desenvolvimento da matriz energética do Brasil), já que sua produção é fruto da conversão direta da energia solar em energia elétrica, por meio de efeitos de radiação.
Destaque-se que o Brasil possui grande potencial de produção de energia elétrica a partir de fonte solar, já que seu nível de irradiação é superior ao dos países europeus com destaque nessa fonte.
Muito embora o marco histórico da energia solar no Brasil seja o 6º Leilão de Energia de Reserva – LER 2014 (Leilão nº 008/2015), o responsável pelo expressivo crescimento da energia solar no país é a Geração Distribuída, instituída pela Resolução Normativa ANEEL nº 482, de 2012 (“REN ANEEL nº 484/2021”).
Nessa linha, a combinação entre a energia solar e a geração distribuída demonstra-se extremamente relevante no atual cenário nacional, haja vista a crise hídrica e os expressivos aumentos nas faturas de energia elétrica.
(a) Geração Distribuída
O Decreto nº 5.163, de 30 de julho de 2004, define a geração distribuída como a produção de energia elétrica proveniente de empreendimentos de agentes concessionários, permissionários ou autorizados, conectados diretamente no sistema elétrico de distribuição do comprador, exceto aquela proveniente de empreendimento hidrelétrico com capacidade instalada superior a 30 MW e termelétrico, inclusive de cogeração, com eficiência energética inferior a 75%, conforme regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL.
Nesse sentido, os Procedimentos de Distribuição de Energia Elétrica no Sistema Elétrico Nacional (“PRODIST”) define geração distribuída como “Centrais geradoras de energia elétrica, de qualquer potência, com instalações conectadas diretamente no sistema elétrico de distribuição ou através de instalações de consumidores, podendo operar em paralelo ou de forma isolada e despachadas – ou não – pelo ONS”.
Logo, depreende-se que a geração distribuída é aquela proveniente de empreendimento localizado próximo aos centros de carga, conectada ao sistema de distribuição da concessionária ou na própria unidade consumidora.
Após estudos realizados pela Agência Reguladora com o objetivo de reduzir as barreiras regulatórias até então existentes para conexão de geração distribuída de pequeno porte na rede de distribuição no Ambiente de Contratação Regulada - ACR, a ANEEL publicou a Resolução Normativa ANEEL nº 482, de 17 de abril de 2012 (“REN ANEEL nº 482/2012”).
A REN ANEEL nº 482/2012 estabelece as condições gerais para o acesso de microgeração e minigeração distribuída aos sistemas de distribuição de energia elétrica, bem como as regras para participação do sistema de compensação de energia elétrica.
Posteriormente, com o objetivo de aperfeiçoar a REN ANEEL nº 482/2012, reduzindo o tempo para a conexão na rede distribuidora, bem como alterando as regras do sistema de compensação de energia elétrica, a ANEEL promoveu alterações nas disposições da REN ANEEL nº 482/2012.
b) Aspectos Gerais da Microgeração e Minigeração
Assim, a microgeração e minigeração são reguladas pela REN ANEEL nº 482/2012, que as define nos termos a seguir:
i. Microgeração Distribuída: central geradora de energia elétrica, com potência instalada menor ou igual a 75kW e que utilize cogeração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, ou fontes renováveis de energia elétrica, conectada na rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras.
ii. Minigeração Distribuída: central geradora de energia elétrica, com potência instalada superior a 75 kW e menor ou igual a 5MW e que utilize cogeração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, ou fontes renováveis de energia elétrica, conectada na rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras.
A figura a seguir ilustra as definições de microgeração e minigeração, nos termos da REN ANEEL nº 482/2012:
Destaca-se que a REN ANEEL nº 482/2012 veda o enquadramento como microgeração ou minigeração distribuída das centrais geradoras que (a) já tenham sido objeto de registro, concessão, permissão ou autorização; (b) tenham entrado em operação comercial; (c) tenham tido sua energia elétrica contabilizada no âmbito da CCEE; ou (d) comprometida diretamente com concessionária ou permissionária de distribuição de energia elétrica, salvo se o empreendimento tiver protocolado seu pedido em data anterior à 25.10.2017.
Registre-se que o ato normativo veda, ainda, a divisão de central geradora em unidades de menor porte para se enquadrar nos limites de potência para microgeração ou minigeração distribuída.
No que tange ao acesso de microgeração e minigeração distribuída ao sistema de distribuição deve ser observada as disposições da Seção 3.7 do PRODIST.
Resumidamente, o microgerador ou minigerador deverá seguir o rito a seguir:
De acordo com a regulação, atendidos os requisitos do PRODIST, a Distribuidora está obrigada a conceder o acesso do interessado para implementar o sistema de microgeração ou minigeração distribuída.
(c) Sistema de Compensação de Energia Elétrica
O sistema de compensação de energia elétrica adotado pelo Brasil, nos termos da REN ANEEL nº 482/2012, é o Net Metering, em resumo, consiste na medição do fluxo de energia em uma unidade consumidora dotada de pequena geração, por meio de medidores bidirecionais (o medidor é capaz de registrar a energia consumida e a energia gerada em um único ponto de conexão).
Registra-se que o Net Metering é adotado por diversos países, dentre eles: Canadá, Itália, Alemanha e dezenas de estados americanos.
O sistema Net Metering é o grande incentivo à instalação de geração distribuída no país, pois fomenta a participação de fontes renováveis, com destaque à fonte solar.
Diferente do modelo feed-in-tariff, em que a energia elétrica injetada possui uma tarifa incentivada, o modelo brasileiro cria uma compensação entre a energia consumida e a energia produzida.
Para melhor compreensão do sistema de compensação de energia elétrica, é importante esclarecer a estrutura tarifária brasileira que, resumidamente, visa custear: (a) energia elétrica; e (b) o uso da infraestrutura da concessionária/permissionária de distribuição “fio” – transporte da energia.
No sistema de compensação de energia elétrica, a energia ativa injetada no sistema de distribuição pela unidade consumidora é cedida a título de empréstimo gratuito para a concessionária de distribuição, gerando um crédito em quantidade de energia elétrica à unidade consumidora por um prazo de 60 (sessenta) meses, sendo eventual excedente de energia objeto de compensação futura.
Após o prazo de 60 (sessenta) meses os créditos de energia elétrica serão revertidos em prol da modicidade tarifária sem que o consumidor faça jus a qualquer compensação.
Registre-se que, somente os consumidores cativos poderão aderir ao sistema de compensação de energia elétrica, sendo vedada a participação dos consumidores do Ambiente de Contratação Livre – ACL no referido sistema.
Segundo as disposições da REN ANEEL nº 482/2012, podem aderir ao sistema de compensação de energia elétrica os consumidores responsáveis por unidade consumidora (i) com microgeração ou minigeração distribuída, (ii) integrante de empreendimento de múltiplas unidades consumidoras (ex. condomínios e shoppings), (iii) caracterizada como geração compartilhada e (iv) caracterizada como autoconsumo remoto.
Para a geração junto à carga, pode ser exemplificada como um painel fotovoltaico em uma residência, conforme ilustração a seguir:
No caso de empreendimentos com múltiplas unidades consumidoras, indicado no item (ii) acima, é caracterizado pela utilização de energia de forma independente, no qual cada fração com uso individualizado constitua uma unidade consumidora e as instalações de atendimento das áreas comuns constituam uma unidade consumidora distinta, de responsabilidade do condomínio, da administração ou do proprietário, com minigeração ou microgeração distribuída. É requisito essencial que as unidades estejam localizadas na mesma propriedade ou em propriedades contíguas. Por exemplo shoppings center e condomínios:
Também é possível a geração compartilhada, caracterizada pela união de consumidores, dentro da mesma área de concessão da distribuidora, por meio de consórcio ou cooperativa, composta por pessoa física ou jurídica, que possua unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída em local diferente das unidades consumidoras nas quais a energia excedente será compensada. O local onde se encontra a microgeração ou minigeração distribuída será considerado uma unidade consumidora, cujo titular deverá ser o consórcio ou a cooperativa.
Observa-se que, nos casos de projetos de microgeração ou minigeração distribuída envolvendo empreendimento com múltiplas unidades consumidoras e geração compartilhada, os consumidores deverão celebrar instrumento jurídico que comprove o compromisso de solidariedade entre os seus integrantes e sua respectiva constituição.
No caso do autoconsumo remoto, trata-se de unidades consumidoras de titularidade de uma mesma pessoa jurídica (matriz e filiais) ou pessoa física que possua unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída em local diferente das unidades consumidoras, limitada a mesma área de concessão em que a energia excedente será compensada.
Ou seja, é possível que o sistema de microgeração ou minigeração distribuída seja implantado em uma unidade consumidora e o sistema de compensação seja usufruído por outras unidades consumidoras, conforme ilustrado acima.
Registre-se que, atualmente, a REN ANEEL nº 482/2012 isenta a incidência da Tarifa de Uso dos Sistemas de Distribuição -TUSD para todas as modalidades de microgeração e minigeração.
Todavia, o art. 6-A da REN ANEEL nº 482/2012 prevê que a concessionária de distribuição não poderá incluir os consumidores no sistema de compensação de energia elétrica nos casos em que for detectado, no documento que comprova a posse ou propriedade do imóvel onde se encontra instalada a microgeração ou minigeração distribuída, que o consumidor tenha alugado ou arrendado terrenos, lotes e propriedades em condições nas quais o valor do aluguel ou do arrendamento se dê em reais por unidade de energia elétrica.
Em consonância com o exposot, o Diretor Relator, em seu voto na Resolução Normativa ANEEL nº 687/2015, abordou que “os contratos de equipamentos podem possuir cláusulas definindo o pagamento de parcelas variáveis associadas ao rendimento e à performance técnica dos equipamentos, mas o valor da parcela principal deve ser fixo de modo a não caracterizar a comercialização de energia elétrica”.
Portanto, a REN ANEEL nº 482/2012 veda somente que a remuneração seja realizada por reais por unidade de energia elétrica, sendo lícito o contrato de locação de equipamentos.
Ou seja, o sistema de compensação de energia promove somente a troca de KWh entre consumidor com geração distribuída e a concessionária de distribuição, sendo vedada a comercialização de energia elétrica.
(d) Quadro Analítico – Estruturação Contratual
Diante do exposto, é essencial que a estruturação contratual observe as disposições acima, sendo, ainda, de suma importância que seja evitada a utilização de minutas padrões, uma vez que cada operação possui suas características específicas.
Assim, o quadro analítico a seguir apresenta as principais questões contratuais que devem ser observadas no momento da estruturação da geração distribuída com energia solar. Vejamos:
Deste modo, considerando os aperfeiçoamentos realizado na legislação vigente, os números atuais e as projeções existentes, é notório o crescimento e protagonismo que vem assumindo a energia elétrica proveniente da fonte solar na geração distribuída e, por consequência, no setor elétrico brasileiro, motivo pelo qual é essencial que os instrumentos que regem essa relação estejam bem estruturados e modelados exatamente nos termos da operação em referência.
Urias Martiniano Garcia Neto (urias@tomasa.adv.br) é sócio de Energia Elétrica do escritório Tomanik Martiniano Sociedade de Advogados.

Urias Martiniano Garcia Neto
Urias Martiniano Garcia Neto é advogado, sócio de Energia Elétrica do escritório Tomanik Martiniano Sociedade de Advogados. Trabalhou por quase 6 anos no departamento jurídico da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Artigos que podem te interessar

Como entender sua conta de luz e transformar o consumo em energia solar inteligente
Saiba como as tarifas, encargos e impostos elevam o custo da eletricidade e descubra o caminho para converter seu consumo em uma fonte inteligente e econômica de energia solar.
14/11/20258 min de leitura

Segurança em O&M de Usinas Solares em Telhados: Normas, Acessos e Boas Práticas
A operação e manutenção (O&M) de sistemas fotovoltaicos instalados em telhados, sejam eles residenciais, comerciais ou industriais, exigem atenção redobrada à segurança do trabalho em altura.
09/10/20251 min de leitura

A termografia deve ser uma obrigação no processo de limpeza
Este tipo de afirmação chega a incomodar, não é? Pois bem, a ideia aqui é justamente trazer o tema para discussão.
06/10/20253 min de leitura

O erro de copiar o SIN: por que a GD precisa de um modelo próprio
Diferenças estruturais entre GC e GD revelam falhas na gestão de ativos e centros de operações
06/10/20253 min de leitura

Armazenamento de Energia: o Brasil não pode perder o bonde da história
O Brasil está diante de uma oportunidade rara: tornar-se protagonista global no mercado de armazenamento de energia.
02/10/20254 min de leitura

Sujeiras impregnadas em módulos fotovoltaicos: causas, limpeza e prevenção
Os produtos indicados e certificados, como encontrá-los no mercado, além de cuidados e estratégias de prevenção.
01/10/20252 min de leitura
Todos juntos vamos, pra frente Brasil, Brasil salve a energia solar
Impacto econômico da Lei 14.300 será pequeno e tecnologia continuará sendo a forma mais barata de gerar energia e um excelente investimento no País
16/01/20238 min de leitura
A aplicação de baterias e geração fotovoltaica distribuída no contexto regulatório brasileiro
A agregação do armazenamento ou compartilhamento de energia é o próximo passo para a energia solar
15/12/20229 min de leitura

