Imposto de importação e juros altos criam cenário adverso para energia solar
Mesmo com demanda existente, impactos econômicos e regulatórios podem levar consumidor final a adiar decisão de investimento


O aumento do imposto de importação de painéis solares, combinada ao nível elevado da taxa básica de juros (Selic) e restrições de instalação de sistemas em razão de alegações de inversão de fluxo, resulta em um cenário adverso para o mercado brasileiro de energia solar. Mesmo com a crescente demanda do consumidor final pela tecnologia, que permite redução com gastos com eletricidade, a atual conjuntura pode levar ao adiamento do investimento.
Para o CEO da ForGreen, Antônio Terra, há uma tempestade perfeita formada no Brasil para uma queda no volume de compras de sistemas fotovoltaicos de geração distribuída. “Temos impactos negativos no campo regulatório, fiscal e na taxa de juros, que impacta todo o financiamento.”
Leia mais: Aumento de imposto de importação de placas solares ameaça investimentos no Brasil
O executivo avalia que o consumidor seguirá interessado na solução e que o mercado irá se ajustar. “Quem tem uma casa e não tem energia solar ainda quer ter um sistema fotovoltaico. O que está acontecendo é que o consumidor vai adiar o investimento, esperar uma redução da taxa de juros, por exemplo.
Atualmente, a taxa Selic está em 11,25% ao ano. Conforme dados divulgados pelo Relatório Focus do Banco Central nesta segunda-feira (25/11), a perspectiva para a taxa básica de juros para o final de 2025 é de 12,15%.
Impacto nos investimentos
Terra classificou a decisão de elevar o imposto de importação de painéis solares de 9,6% para 25% como “uma ducha de água fria” e “uma contradição total entre discurso e prática” do governo federal em relação à transição energética. “Nós trabalhamos dentro do regime de cotas, mas sabemos que, pelo volume de importações, vai acabar em breve e teremos que pagar o imposto de 25%. Isso não estava previsto.”
O executivo explicou que a medida obriga a empresa, que atua no desenvolvimento de fazendas solares para o mercado de GD, a ajustar a carta de investimentos para os próximos anos. “Com a cota esgotada, temos um planeamento de readequação da alocação de capital para os próximos anos. Seguimos otimistas com o setor de renováveis, mas vemos uma dinâmica de redução de incentivos.”
Retrocesso
O aumento de imposto de importação de placas solares gerou repercussão negativa durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2024 (COP29), realizada no Azerbaijão entre 11 e 22 de novembro.
Instituições como o Global Solar Council (GSC), a SolarPower Europe (SPE) e o National Renewable Energy Laboratory (NREL) alertaram aos líderes globais presentes no evento que o Brasil está sob risco de retrocesso na sua transição energética com a nova medida.
Para as entidades, o aumento no imposto de importação afasta o Brasil das ambições e metas dos acordos internacionais de combate às mudanças climáticas.
Segundo o diretor de Relações Internacionais da SolarPower Europe e atual chairman do GSC, Máté Heisz, medidas protecionistas como a tomada pelo Brasil são estratégias perde-perde, pois não têm efetividade para fortalecer as fábricas locais e ainda prejudicam o crescimento do mercado solar doméstico.
“Tivemos uma experiência parecida no mercado europeu, há cerca de dez anos, com o estabelecimento de um preço mínimo de importação para painéis solares. O resultado foi negativo em vários sentidos, pois eliminou grande parte da demanda interna, ou seja, do mercado solar, e não trouxe ganhos para a fabricação local”, destacou Heisz.
A CEO do GSC, Sonia Dunlop, reforçou que a tecnologia fotovoltaica é potencialmente barata e acessível aos consumidores brasileiros, seja em residências ou em pequenos negócios, e que a medida do governo brasileiro pode prejudicar os preços da energia solar para a sociedade. “Não faz sentido elevar o custo da tecnologia, pois quem paga a conta é sempre o consumidor”, alertou.
O diretor do National Renewable Energy Laboratory (NREL), Martin Keller, apontou que muitos governos têm dificuldade de entender de onde surgem os empregos verdes na cadeia solar fotovoltaica ao redor do mundo.
“Na prática, os setores de distribuição de equipamentos e instalação de sistemas fotovoltaicos são os que mais geram oportunidades de trabalho. A área de fabricação tem uma representatividade muito pequena na criação de empregos. Portanto, não se pode criar obstáculos justamente nos segmentos mais pujantes da cadeia solar”, disse o especialista.
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Investimentos em risco
Em diferentes painéis da COP 29, o presidente executivo da ABSOLAR, Rodrigo Sauaia, também alertou sobre a preocupação do setor fotovoltaico brasileiro com a medida do Governo Federal e seus impactos negativos para o mercado solar e os projetos em desenvolvimento pelo setor.
Conforme a entidade, há risco real de congelamento e cancelamento dos investimentos previstos, perda de empregos verdes e retrocesso ao desenvolvimento sustentável. O dirigente participou ativamente de diversos debates ao longo do evento e, nestas ocasiões, demonstrou quão negativa é a contradição do Governo Federal entre discurso e prática na energia solar.
“Esta decisão protecionista do Governo Federal é ineficaz e danosa aos consumidores, pois encarece a energia solar para a sociedade brasileira, sem ganhos concretos para nossa transição energética. Isso compromete as metas internacionais de combate ao aquecimento global assumidas pelo país”, disse Sauaia.
Um mapeamento da Absolar sobre os projetos em potencial risco com o aumento de imposto revela que há, pelo menos, 281 empreendimentos fotovoltaicos em situação crítica, incluindo um montante de mais de 25 gigawatts (GW) e R$ 97 bilhões em investimentos que seriam entregues até 2026. Estes projetos podem contribuir para a geração de mais de 750 mil novos empregos e a redução de 39,1 milhões de toneladas de CO2.
Pela análise da entidade, a medida do governo pode inviabilizar os projetos por completo, por conta da perda automática do financiamento vinculado ao empreendimento, trazendo alto risco na modelagem financeira das grandes usinas solares.
O financiamento desses empreendimentos exige um padrão de certificação e qualidade nos equipamentos utilizados que as indústrias nacionais ainda não possuem, o que obriga a compra dos equipamentos importados, agora sobretaxados.
As duas únicas fabricas nacionais de módulos fotovoltaicos não possuem capacidade de suprir nem 5% da demanda nacional de painéis solares, pois possuem uma capacidade de produção máxima de 1 GW por ano, montando os equipamentos a partir de insumos importados, ao passo que a demanda do mercado solar brasileiro em 2023 foi de mais de 17 GW.

Ricardo Casarin
Repórter de economia e negócios, com passagens pela grande imprensa. Formado na Universidade de Metodista de São Paulo, possui experiência em mídia impressa e digital e na cobertura de diversos setores como petróleo e gás, energia, mineração, papel e celulose, automotivo, entre outros.
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